domingo, setembro 11, 2016

cre(cher)

Ando constipado. Andamos todos cá em casa, menos o gato. Ontem deitei-me cedo na esperança de compensar noites mal dormidas. Mesmo acordando pelas 7h40 para dar biberão ao puto, continuo a acordar cansado, ensonado e com pouca energia. Síndroma de 'night person' ou meramente o acumular dos dias intensos? Já nem sei.


Achei que começar a despachar-me pelas 9h25 dava tempo para tratar do puto, deixá-lo na creche e ir a um visionamento. Enganei-me. Há sempre imprevistos. Bastam umas novas peças de roupa ou um pouco mais de rabugice e perdem-se mais uns minutos. 


Já perto das 10h20 (depois da viagem de 5 minutos onde pus como habitualmente na Smooth para por o puto no ponto) estaciono o carro no sítio do costume, junto à creche e, ao tirar o puto do carro, uma senhora nos seus 70 aproxima-se do meu puto e mete-se com ele. Fica viciada assim que vê o primeiro sorriso – o puto é social, gosta de pessoas e de sorrir para elas – e começa a falar que tem saudades de cuidar do neto com aquela idade. Isto enquanto eu faço ginástica, com o puto ao colo, para tirar o saco com o almoço do carro e colocar o cinto na cadeira de bebé. Ela continua a falar do neto, agora com seis anos, e em como o filho se desentendeu com ela e o neto não percebe porquê. 
Depois começa a acompanhar-me um pouco no caminho, comigo a ouvi-la e respeitá-la mas a ter dificuldade em perceber a história complexa de zangas familiares. Percebi claramente que ela já tem dificuldade em se exprimir e em arrumar as ideias e memórias mas sentia acima de tudo necessidade em desabafar.

Deixei-a falar um pouco, enquanto o Vasco ia sorrindo a espaços, e despedi-me desejando-lhe sorte. 
Entrei pelo jardim escola pelo sítio do costume, a secretaria – é mais fácil quando se deixa o puto depois das 10h, como é sempre o meu caso – e como é já da praxe, as funcionárias procuraram receber o tradicional sorriso do jovem Vasco e ele correspondeu.

Subi o lance de escadas, com o puto a explorar como sempre o percurso, como quem planeia um plano de fuga caso se torne necessário. Mais uns 'bons dias' e sorrisos, agora às miúdas que já brincam no jardim, e lá o deixei na creche, com mais quatro colegas de turma – dois dormiam calmamente. 


Ao sair, hoje com alguma pena por não ficar com ele mais tempo de manhã – sorry puto! –, uma miúda dos seus dois anos ainda na ala do infantário vem ter comigo a chorar. Está a tentar fugir – embora aquela ala esteja fechada. 
“Quero a minha mamã!” Diz-me em lágrimas e enquanto segura um peluche. Eu já estava a sair mas peguei-lhe ao colo, acalmei-a um pouco, meti-a no chão (lembrei-me que se calhar não devemos pegar ao colo os filhos dos outros, especialmente quando os pais não estão presentes), dei-lhe a mão, e levei-a com calma para o quintal do infantário para junto das educadoras enquanto lhe ia dizendo: “A mãe volta mais logo. Agora podes brincar com os teus colegas. Tens brinquedos giros. Vai correr tudo bem.”

O que se diz a uma miúda nestas circunstâncias? O cliché, o típico, nada e tudo. Deixei-a com as educadoras e disse-lhe adeus com um sorriso. Ela sorriu brevemente de volta mas regressou de imediato às lágrimas e a chamar pela mãe. 


Com tantas peripécias falhei o visionamento mas ganhei uma história e uma pseudo-moral: com 2 ou 72 anos, todos precisamos de atenção, todos precisamos de amor da família/amigos, todos sentimos falta quando não a temos – ajuda se tentarmos ser mentalmente saudáveis o máximo de tempo possível.