This one goes to the one I love. This one goes to the one I left behind.
Eles morreram todos, e eu morri, em parte, com eles. Entre a vida e as suas intensidades, a intensidade final e absoluta é a morte. Daí, Sete Palmos de Terra significar tanto. Significa a morte, e a vida que a ela guia.
Desde muito cedo recordo-me de ter pesadelos sobre a morte. Pesadelos intensos e que, embora sem muito sentido, eram o que de mais real e aterrador parecia existir. Porque a nossa vida tem um fim. Quando somos pequenos e percebemos que um dia, a morte chegará até nós, entramos em pânico. Eu entrei. A solução mais clara, a minha foi, acabou por ser recorrer a alguém mais velho, mais experiente, para partilhar a sua visão da matéria. A minha mãe. A minha querida e paciente mãe. Aquela que me falava da família, a história da minha família, das gerações anteriores, de tudo aquilo que passou e que ela conhecia, de perto, ou de ouvir a mãe dela contar. Não sei bem porquê, aperceber-me de tanto que se passou para trás, tantas pessoas, tanta vida, ajudava-me ligeiramente. Não era só eu. Acontecia. Era a morte. Era natural. Mesmo assim não me tranquilizava totalmente ou não fosse o fim, aparentemente absoluto. Era daquelas questões que logo à primeira pergunta intranquilizava os adultos.
A minha mãe tinha o cuidado de me tranquilizar, naquelas noites de Outubro, Novembro, Dezembro, Janeiro. O Inverno tinha sempre o condão de me tornar mais sensível à vida, ao que se passava à minha volta. Era profícuo em sonhos, pesadelos e introspecção. Descoberta do novo mundo em que me encontrava. Sim, já tinha vários anos neste mundo, neste corpo, neste planeta. Mesmo assim é a partir de certa idade que percebemos determinadas coisas, como por exemplo, a morte.
Como é que alguém tão estimado em vida é colocado debaixo de terra por tempo indeterminado? Uma pergunta legitíma a que poucos pareciam querer responder. Sim, deixou de ter vida, mas não compreendia como é que o corpo poderia deixar de ter vida ou como ao morrer, tratavam-no tão mal. Era por isso que insistia, 'Eu não quero ser enterrado... o meu corpo é para ficar intacto', dizia eu insistentemente para quem queria ouvir, a minha mãe.
A morte é intrinseca a todos nós, neste planeta.
Agora, um quarto de século depois de ter nascido. 25 anos de 'mundo'. Passam-se dias, semanas, meses, anos, sem pensar verdadeiramente na morte. Muito ocupado, pouco tempo para pensar nisso, pouca vontade, comodismo à vida que levo, mesmo que não seja preenchida.
Pensar nisso talvez não ajude ninguém, ou talvez ajude.
Esta noite a série Sete Palmos de Terra fez-me pensar nisso de uma forma intensa e como não pensava há muitos muitos anos. Como nunca nada que tenha sido produzido, para televisão, teatro, cinema, ou outra qualquer forma de expressão artística tinha conseguido.
O último episódio desta série é também o último momento de vida de todas estas personagens tão maravilhosamente belas, irritantes e cheias de vida, tristeza e alegria. É também o meu último momento de vida. Ver a morte e funeral de cada um dos membros daquela amálgama de família fez-me ver, ao mesmo tempo, a minha família e o meu futuro, a minha morte e a minha essência. Aquela que desaparecerá para todo o sempre. Fez-me ver em como é isto que mais nos une e iguala, nós, seres humanos.
Recordo-me de crescer e pensar como seria ver morrer os meus pais, ou os meus irmãos, ou os meus primos, os meus amigos. Ou então morrer primeiro que todos eles, e sentir que deixei tanto.
Façamos o que fizermos, o mais importante que deixamos por cá são as pessoas, aquelas que nos afectaram e afectámos. Não numa perspectiva grandiosa ou de fãs - algo que faz com que tantos se queiram destacar e ter milhares de seguidores - mas na forma de aqueles que tocámos com o nosso verdadeiro ser, esses que são poucos pela ordem natural da vida.
Esta noite chorei compulsivamente, com arrepios, baba e ranho, de beicinho e livremente mais do que na morte de Nate porque, esta noite, morri e vi os meus morrerem, mesmo que fosse durante dois ou três minutos.
Boa noite e... boa caminhada para a morte.
"All we have is this moment, right here, right now. The future is just a fucking concept that we use to avoid being alive today. So, be here now."